Plano para uma tatuagem (sol/flor num lugar meio punk)Em 14/agosto/2012 um amigo-de-Facebook de um amigo/ex-aluno meu postou no Facebook este vídeo aqui, que naquele momento já era super viral: Na hora eu pensei: UAU!!! Todo mundo reconhecia como a garota maluquete era poderosa com aquela tatuagem - tava todo mundo feliz, e as pessoas faziam umas brincadeiras ainda meio tímidas - e no dia seguinte eu estava fazendo brincadeiras menos tímidas sobre o assunto com um amigo e uma amiga, e no outro dia já estava claro pra mim que as minhas brincadeiras que eu tinha feito tinham um fundo sério muito grande. Eu penso em possíveis tatuagens pra mim desde 1995, e esta era a primeira vez que eu tinha certeza absoluta de uma que eu queria fazer, que eu tinha certeza absoluta de que me deixaria muito feliz e orgulhoso - e neste momento eu ainda nem tinha claramente o desenho - eu pensava num sol, mas estilizado de que jeito? - ele só apareceu no dia seguinte... Por sinal: o desenho da tatuagem da garota nem é tão fantástico assim, e nem todo mundo que faz tatuagens aí acha o processo tranquilo e agradável... mas o poder de uma tatuagem não vem daí. Citando o Spider Webb (Skin & Ink, nov/1997, p.64):
A imagemEu resolvi usar este desenho aqui: que é da capa de um disco da Kristi Stassinopoulou - dá pra ouvir trechos de algumas faixas dele aqui; ouça a 12 - e que foi a imagem que eu usei como logotipo da minha chapa pra Direção do PURO no ano passado... pra resumir: eu nunca me encaixei em grupo nenhum e sempre mantive distância de partidos, sindicatos e cargos, mas em 2011 as pessoas legais do PURO estavam tentando montar uma chapa pra concorrer com a dos zumbis (veja também este e-mail), e eu acabei virando vice da Eblin... Nosso objetivo era no mínimo forçar a comunidade a debater bastante. Os debates foram tão fantásticos, saiu tanta coisa, que o aluno da computação que tinha se voluntariado pra filmar o segundo debate (o primeiro não foi gravado) resolveu apagar as gravações! Tem uma página grande sobre tudo o que aconteceu na campanha aqui. Acho que ele foi pressionado a apagar as gravações porque um zumbi fez uma pergunta que pegou muito mal - como é que eu podia me candidatar à vice-direção se eu tinha dificuldades até em entregar as provas corrigidas dentro do prazo estabelecido pelo regulamento, e alunos já tinham feito abaixo-assinados contra mim reclamando disso - e eu respondi brilhantemente, falando das dificuldades que eu tive e que qualquer professor iniciante vai ter e explicando como a gente tem que lidar com esses problemas abertamente. Acho que a simbologia mais forte dessa tatuagem pra mim é: lidar com os problemas abertamente. Por exemplo: eu tive questões de gênero gigantescas a minha vida inteira, nunca nem aprendi direito a lidar com os códigos masculinos de macheza, marrentice e estupidez, e questões sexuais também - não aprendi a galinhar que nem os meus colegas quando eu era adolescente (aliás nem depois), e me senti péssimo por isso; levei décadas pra ter clareza de que eu precisava de relações baseadas em confiança e igualdade não em sexo e poder - e isso é inconcebível no Rio de Janeiro, então acabei sexofóbico militante ("sexo estraga tudo"); e mesmo a minha convicção de que eu me daria melhor com um namoradO que com uma namoradA deu errado - eu tive um namorado uma vez e eu era super apaixonado por ele, mas não consegui transar com ele por travações minhas, e tenho a maior vergonha disso... Aí acabei escrevendo o Rape Recovery Journal (links: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7), que no início era um blog secreto, e isso me abriu mil portas. Agora eu sou uma vadia também -e vou participar das próximas marchas. O meu corpo é meu, e o que antes era vergonha agora é bonito. Quase ninguém vai ver - só umas 10 pessoas viram o meu PA nos nos quase 15 anos que eu o usei (agora ainda tenho o furo, mas sem a jóia) - mas várias pessoas vão ouvir falar... algumas por vias erradas, como "boatos horríveis". Digamos que numa situação como o debate na eleição pra direção do PURO, acima, alguém pergunte: como é que alguém com uma tatuagem na bunda vai ser respeitado pelos outros diretores nos Conselhos Superiores? Ora, eu não quero ser diretor de nada, isso é uma roubada. Mas quero os debates. E essa noção de "respeitabilidade" que nos é imposta - e que inclui não expôr nada estranho em público - não é uma obrigação absoluta. Podemos chutar o balde, e sacrificá-la intencionalmente por algo maior. Eu posso ir na próxima Marcha das Vadias com um cartaz dizendo: "Eu perdi o seu respeito? EU SEI. Mas o que eu ganhei me manifestando em público vale cem vezes mais". Uma idéia que talvez ande meio escondida por aqui é que a nossa aparência sempre conta uma história - e essa história vai determinar o tipo e a qualidade da atenção das pessoas que interagem com a gente; e a gente é responsável por calibrar a nossa aparência da melhor forma possível. Uma citação desta reportagem grande sobre alguém que tinha tatuagens deslumbrantes (outros links: WP, PBS):
Não sei se a garota do vídeo lá do topo da página vai lidar bem com o impacto do que ela fez - tomara que sim. Tem umas entrevistas com ela aqui e aqui. Já vi algumas respostas estúpidas ao vídeo dela - por exemplo a deste redneck aqui. Mas milhares de outras pessoas que não a garota do vídeo podem responder - e estão respondendo - a todos estes tipos de pensamentos tacanhos, e quando esses caras se manifestam a gente consegue entender um pouquinho como eles pensam, e começar a criar respostas e a preparar espaço pra que eles possam mudar.
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