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Falta Misandria no Movimento Trans, 0

Esta discussão aconteceu no grupo "Transfeminismo <3", neste thread, entre 1º/maio e 3/maio/2015.
Me baniram deste grupo - e depois de um outro, "Feminismo Trans", veja abaixo - aí eu acabei escrevendo este zine.
Eu reconstruí o que deu da discussão a partir dos e-mails que o Facebook me mandava.
Um pedaço desta discussão aparece no PDF do zine nas págs 41-43.


Virginia Guitzel 9:41pm May 1
Meninas, queria ajuda pra opinar num tema tão delicado. Achei o texto BEM TRANSFÓBICO, os conceitos de identidade de gênero e a questão da "mulher materialmente" (CIS). É bem bizarro, mesmo assim, o debate sobre estupros corretivo é foda e não pode ser silenciado tbm....
O Queer promove estupro corretivo de lésbicas
https://milfwtf.wordpress.com/2015/04/28/o-queer-promove-estupro-corretivo-de-lesbicas/

JJ Barbosa 11:31pm May 1
Vou até parar de ler esse monte de bosta

Stephanie Zuma Ribeiro 12:05am May 2
Sou mulher Cis, mas se me permitem... CARACA, O QUE SE PASSA NA CABEÇA DESSAS MINA RADFEM?!?!?!?! Pqp!!

Eu não consigo entender. Queria saber de onde vem tanta merda que elas cagam pela boca. :(

Virginia Guitzel 12:10am May 2
Gente, to lendo o texto que a Bia Pagliarini Bagagli, mas queria saber sobre essa questão do movimento das mulheres lésbicas (cis e trans). Eu não me reivindico lésbica, mas quando li o texto via que a questão do estupro corretivo é bem específico as mulheres cis, pois é para "corrigir a sexualidade", assim como as "mutilações e violência corretiva" de cortar nossos cabelos, tirar nossa peruca, cortar os seios, não permitir o uso dos hormônios se somos presas, publicar fotos com nossos rostos deformados, etc, etc, etc via Verônica é bem próprio das mulheres trans pois quer "corrigir nossa identidade de gênero". São duas coisas péssimas de tortura em defesa da hetero e cisnormatividade, que vão muito além e acho que precisam ser problematizadas, que esse texto zuado não se propõem a debater.

Bia Pagliarini Bagagli 12:21am May 2
Então, não existe "estupro corretivo" quando dizemos que homossexualidade não requer simetria genital. Dizer que orientação sexual não depende de genitalia não implica em forçar a vc se relacionar com quem você não queira. Deveria ser óbvio, mas a desonestidade é tamanha que dizer o óbvio acaba virando necessário. Dizer que sexualidade não é definida pelo genital é apenas dizer isso. Não implica em dizer que mulher cis "tem que" se relacionar com mulher trans... nada disso. Esse texto não se propõe a debater de fato questão nenhuma, o que ele quer fazer é a todo custo tentar incriminar mulheres trans ou o que ele entendo por "queer", debate nenhum tem ali. Gente, é só se deparar com o título sensacionalista pra entender qual é o teor do texto. Como você pode dizer que o "queer promove estupro"? Que queer é esse, a teoria queer? Quer dizer que teóricos queer, que incluem notórios nomes de autoras cisgêneras como Butler, Lauretis, Haraway, etc, promovem estupro com suas teorias? Olha, realmente...

Eduardo Nahum Ochs 5:32am May 2
Eu sempre leio esses textos de TERFs com uma certa curiosidade... e só agora, depois de pensar horas nesse aí enquanto eu rolava na cama, acho que entendi o porquê.

A autora dele fala de certas coisas irracionais como se fossem perfeitamente racionais e razoáveis. A gente sabe que coisas são essas - são "deslizamentos", como a Bia explica super bem neste texto aqui,
http://transfeminismo.com/o-banheiro-e-a-ideologia/
entre "pênis", "estuprador em potencial", "estuprador", "estupro corretivo", etc.

As afirmações do texto são delirantes e até nocivas pra outra pessoas; disto a gente está careca de saber e de dizer. Deixa eu falar sobre OUTRA coisa.

A autora tem uma segurança pra falar dessas coisas que tem um quê de invejável. Tenho lido ultimamente um monte de textos de pessoas que tiveram problemas de auto-aceitação enormes, mas que agora escrevem coisas como "eu sou gorda e negra, mas agora eu tenho orgulho disso, eu sou foda, e eu me amo". Esse tom, que eu chamo de "empoderado", dialoga bem com os discursos de certeza que a gente vê por aí em todo lugar - em muitos meios a coisa mais importante pra você ser ouvida é você ter _muita_ segurança do que está dizendo.

Bom, deixa eu copiar aqui um trecho de uma das minhas primeiras mensagens de saída do armário. Ela ficou super bem escrita, e não vale a pena eu tentar parafraseá-la ao invés de copiar do original.

"No início, quando eu era pequeno, eu achava só que eu tinha dado azar. As meninas podiam fazer tudo de legal e podiam pensar e conversar sobre o que queriam e serem sinceras; já os meninos tinham que ficar fingindo o tempo todo que gostavam de um monte de coisas idiotas só pra provarem pros outros que eles eram machos, e ficar fazendo papel de macho era algo tão infernal que a gente vivia explodindo de frustração e raiva... aí o que eu entendia era que os outros meninos descarregavam essa raiva se sacaneando e se batendo, e eles ficavam tão ocupados com isso que eles não tinham tempo pra pensar nada de diferente... e como eu era magro e fraco e tinha defeitos de personalidade eu não conseguia me encaixar e aí eu ficava só vendo tudo como se eu estivesse de fora... e eu tinha a impressão - aliás, a "esperança"! - de que se eu me esforçasse MUITO e virasse uma pessoa muito interessante quando eu crescesse eu acabaria encontrando as outras pessoas que também sabiam que o mundo masculino era uma farsa, e teriam construído jeitos de viver fora dessa farsa..."

Então, voltando ao texto da TERF... o que ele tem que é um pouquinho invejável é que a autora consegue falar de assuntos que são gatilho pra ela - e "pênis" é mega-gatilho pra ela - sem engasgar no meio de cada frase pela certeza de que não só não vai ser entendida como vai ser patologizada.

Quantos assuntos a gente tem, principalmente sobre motivos que nos levaram à transição, e fobias e gatilhos que permanecem mesmo depois da transição, que a gente mal se atreve a conversar com meia dúzia de pessoas mais próximas?

O tom da TERF autora do texto pra mim é um tom masculino, pelo excesso de afirmações e pela falta de auto-crítica =(... mas eu fiquei imaginando, nesse tempo em que eu fiquei rolando na cama e pensando depois de ler o texto dela, o quanto pode ser empoderador pras mulheres irem em encontros de RADs cheios de TERFs e poderem falar livremente sobre coisas que em outros espaços pareceriam paranóias, e serem ouvidas.

Na verdade acho que o principal motivo de eu pensar tudo isso é que eu tenho tido super poucas oportunidades de encontrar outras pessoas trans ao vivo, e algumas coisas que eu tenho lido de ativistas trans - por exemplo isto (principalmente os comentários):
https://www.facebook.com/andreigiu/posts/1559902204276071
me dão uma nóia de que em eventos trans eu talvez acabasse ficando à margem num canto sem conseguir me expôr ou puxar papo com quase ninguém, porque a minha vivência é bem diferente dos relatos que eu vejo... eu comecei a TH muito tarde, e antes disso eu vivi meio invisível, tentando fazer com que aparência física, namoros, sexo, etc, ficassem bem em segundo plano na minha vida - eu pensaria direito nessas coisas quando eu crescesse... então, sei lá, vai que os espaços trans estão ocupados só pelas pessoas que tem questões "externas", as pessoas que o tempo todo põem a cara no sol e levam porrada, e elas não têm mais questão "interna" nenhuma?...

Bru Waldorf 6:21am May 2
Só pelo titulo eu nem vou ler...por q ja sei q tem chorume de terf.

Cássia Rodrigues Silva 6:34am May 2
Como se homens trans nao corressem o tempo todo o risco do estupro corretivo. Transfobico até a raiz.

Dorothy Lavigne 9:47am May 2
mimimi

Dorothy Lavigne 9:55am May 2
Virginia Guitzel, novamente vou discordar de ti: esse texto é totalmente descartável, falou besteira do começo ao fim, já contando pelo titulo

Virginia Guitzel 11:06am May 2
Dorothy Lavigne é mais implicância do que "discordar", esse texto OBVIAMENTE não é meu. E não concordo com ele. Preste atenção!

Dorothy Lavigne 11:31am May 2
sim, se o texto fosse seu, já tinha levado um BAM rs

Virginia Guitzel 11:32am May 2
Jamais seria, Dorothy. Eu tenho princípios e sigo lutando pelo o que acredito, não saio por ai sendo inconseqüente e falando qualquer merda sem nem ler...

Dorothy Lavigne 11:35am May 2
relaxa, gata, se pareceu que eu estava insinuando que o texto era seu, eu devo ter me expressado mal. Eu sei sua posição e não tem nada a ver. Só reitero que o texto daqula terf é das ruim que não merece nem ser lido (Y)

Beatriz Calore 12:09pm May 2
o fato é que qualquer lésbica pode se sentir atraída por uma mulher trans. negar isso é hipocrisia

Eduardo Nahum Ochs 6:57pm May 3
Tudo bem que várias pessoas aqui acharam o texto de TERF péssimo sem nem lê-lo... mas eu fui relê-lo agora pra escrever mais sobre ele - ou aqui ou só pra uma amiga minha - e achei ele MUITO bom.

Eu tinha ficado com a impressão de que a autora deixava _explícito_ que ela tinha sido violentada, e aí a partir desse ponto do texto ela iria se permitir falar sobre os gatilhos dela e sobre ela ver estupro em todo lugar... agora que eu reli eu vi que não é bem assim, tá só implícito, mas escrito de um jeito tão forte que dá pra inferir as vivências dela - e, aliás, depois que eu fucei um pouco mais o site dela, vi que estão escritas em detalhes em outros posts.

Tem uma coisa lá no meio do texto dela que eu achei MUITO foda. Ela diz: "NÃO SABER LIDAR COM UM NÃO PARA UMA INVESTIDA SEXUAL É SOCIALIZAÇÃO MASCULINA". Eu tou há meses tentando deixar mais claro o que é "homem", "mulher", "masculino", "feminino" pra mim e porque o "mundo masculino" era um inferno, e essa idéia é uma boa chave de pensamento.

Eduardo Nahum Ochs 7:01pm May 3
...e eu ia comentar aqui que acho uma estratégia ruim a gente chamar as histórias pesadas dos outros de mimimi, porque isso praticamente convida as outras pessoas a dizerem que as nossas histórias são mimimi também... mas fiquei deixando pra quando eu conseguisse escrever de um jeito mais caprichado, e agora vi que ao invés de usar as minhas palavras eu posso fazer uma citação. Lá vai.

"Quem se omite diante da dor não escolhe a neutralidade. Escolhe afundar ainda mais a vítima numa lama de culpas, nojos e medos. E eu só tinha o papel para enfrentar o que passava sem perder a lucidez."
https://milfwtf.wordpress.com/2014/06/23/sobre-pedofilia-e-a-minha-primeira-historia-de-horror/

Bia Pagliarini Bagagli 7:10pm May 3
Não Eduardo, não acho essa frase nem um pouco "foda". Continua sendo transfóbica. O que ela está querendo dizer é que mulheres trans são "homens na verdade". Ela está dizendo que mulheres trans são educadas como homens e teriam poder de coagir as mulheres cis a entrarem em relacionamentos abusivos. Acontece que a realidade concreta não pode sustentar essa tese. Quantos casos de mulheres trans abusadoras de mulheres cis vc conhece? Provavelmente nenhum ou poucos casos isolados, isso porque não existe base material na nossa sociedade que conceda esse tipo de poder às mulheres trans.

Não há nada de empoderador nestes textos. Não é ético você tentar se empoderar vilipendiando e incriminando outras minorias. Isso não é um feminismo ético. Ninguém está chamando as histórias de abuso de "mimimi". Estamos discutindo que transfobia JAMAIS é aceitável como forma de luta política, por mais que a pessoa tenha sido traumatizada. Mulheres trans não são culpadas pelos traumas que a autora passou, e incriminalas enquanto minoria continua sendo uma prática transfóbica e inaceitável.

Seria empoderador a luta de mulheres brancas, ao entrarem no mercado de trabalho e nos estudos, por exemplo, se aproveitarem de empregadas domésticas que são exploradas e na maioria das vezes negras? É empoderador um minoria se aproveitar das fragilidades de outras pra se empoderar e fazer disso luta política? Não é. Esse blog é transfóbico e não há nada de politicamente útil ou eticamente aceitável que venha dele.




Esta outra discussão aconteceu no grupo "Feminismo Trans <3", neste thread, entre 14 e 18/maio/2015.
Pra cada comentário lá posterior ao único comentário que eu fiz o Facebook me mandava um e-mail
com o post original do Uri, o comentário novo, e alguns anteriores... a reconstrução abaixo tem tudo
o que eu recebi nestes e-mails - pode ser que falte bastante coisa.
O Facebook obviamente parou de me mandar esses e-mail quando me baniram do grupo.
O Uri foi uma das pessoas que me bloqueou quando "denunciaram" que eu era "ex-trans virando rad".
Pus um pedaço dessa discussão no zine "Falta misandria...", na p.44.


Uri Silvani 12:04pm May 14
[desabafo]
Desistindo do feminismo...
Desistir do feminismo é desistir de muitas pessoas também.
Mas até que ponto vale a pena quando você mesmo se sente abandonado dentro do movimento?
Não há inclusão. Caramba não tem. Por mais que você insista, não há inclusão de pessoas trans em espaços não-transfeministas. É mina cis que era intersec virando rad, é "ex-trans" virando rad, é gente que não tem a mínima empatia e vive numa bolha cis de privilégios, no sentido até de serem ingenuamente desinformadas. Mas aí você fala, cansa, fala e cansa mais, e mais gente aparece pra cagar o rolê, mesmo que algumas se desconstruam. Fiquei muito mal por ter sido colocado no mesmo saco que homem cis ontem, e eu espero que a pessoa se desconstrua. O problema é que ela não é a única. To cansado dessa merda de socialização. Ao mesmo tempo não queria desistir saca? Alguém me dá uma luz, por favor :(

Ivan Cer 1:59pm May 15
Que morte horrivel

Max Gomes 3:25pm May 15
É uma situação bastante complicada Uri :(
Mas usando de toda a sinceridade do meu coração: eu acabei descobrindo um feminismo muito mais acolhedor apenas em espaços trans. E é nele, e por ele, que luto de verdade. Reconheço a luta das irmãs cis e ajudo no que eu puder ajudar (mesmo muitas usando seus privilégios e indo contra mim. Nem tudo é lindo). Contudo, minha luta é contra o patriarcado e acredito que, como consequência, algumas vendas transfóbicas vão cair dos olhos de algumas feministas e elas finalmente vão entender que estão atacando as pessoas erradas. Pelo menos acredito nisso . Mantenha-se forte e qualquer coisa, só chamar. e

Uri Silvani 5:51pm May 15
Obrigado por isso, Max Gomes :)

Eduardo Nahum Ochs 2:40am May 16
...e eu tou aqui torcendo pra pessoa "ex-trans virando rad" não ser eu, porque deve ter pelo menos 3 pessoas me rotulando assim agora... me expulsaram de um grupo e várias pessoas me bloquearam sem explicação depois que eu escrevi essas coisas aqui,
http://angg.twu.net/falta-misandria.html
eu sei que eu pisei em gatilhos, mas não imaginei que ia ser tão grave... porque por mim eu estava tentando pensar exatamente sobre que tipos de "pertencimento" a gente deveria estar procurando - tem coisas que acabam me soando como a rixa eterna da turma da rua de cima com a turma da rua de baixo...

Uri, tomara que a gente consiga se encontrar novamente, você é uma pessoa muito, muito bacana. Se cuida. =|

Flávia Mazzini Aldini 8:48pm May 17
Olha, dá para entender teu lado porque eu tenho visto tanta coisa frustante na net... Mas feminismo não é só internet, é dia a dia. É se empoderar e lutar por igualdade entre os gêneros. Essa coisa da socialização é algo que buga minha cabeça, já que sempre vejo o argumento de socialização em dedos de terf (sou libfem, elas também não morrem de amores por libfem). Eu acho desonesto falar da socialização forçada contra apenas mina cis e tacar o foda-se para a também forçada socialização contra pessoas trans. Não deixe que o que elas falam te atinja e cuide da gastrite, porque crises de gastrite são o cão.

Bru Waldorf 9:29am May 18
Vc foi expulse do grupo porque concordou com um texto totalmente transfobico, num foi Bia?!?!

Bru Waldorf 9:29am May 18
E ainda ficou relativizando transfobia.

Ivan Cer 9:31am May 18
Que? Bia relativizando transfobia e concordando com rad, que viagem eh essa

Bru Waldorf 9:31am May 18
E eu não sei aonde falta misandria no movimento trans, pessoas mais misandrica que nem existe :3

Bru Waldorf 9:33am May 18
To falando pra Eduardo... eu vi a discussão, concordou com um texto totalmente transfobico, ficou dando razão pra terf e relativizando transfobia, por isso foi expulse, marquei a Bia por q ela tava na discussão.

Bia Pagliarini Bagagli 2:02pm May 18
Eu o que? Jamais concordei com feminismo radical.

E sim, Eduardo foi expulso de outro grupo porque coadunou com um blog extremamente transfóbico.

Ivan Cer 2:27pm May 18
Sim, Bia, eu sei disso >.< Eh que foi o que entendi do comment, mas questionei por ter certeza que nao. Vou ate apagar pra nao dar margem a confusao, pois basta o que ta rolando com a Amara; hoje em dia tem que ter o triplo de cuidado ja pensando em como alguem vai deturpar o que a gnt diz