Prezados,
Acabo de receber e-mail da professora Aparecida Lino declarando que tive minha bolsa de doutorado cancelada.
Além de estar aborrecida por ter tido minha bolsa sumariamente cortada e indignada com a arbitrariedade da Capes e do CNPq a respeito das decisões tomadas, estou profundamente impressionada com o fato de as universidades, mais especificamente a UFRJ, terem cedido a uma ordem que mais se assemelha a uma chantagem, pois ameaçava os programas de pós-graduação de corte definitivo das cotas referentes às bolsas que não fossem cortadas.
Sou professora do ensino básico, de 6º a 9º anos, trabalho numa "Escola do Amanhã" (ou seja, numa escola que estava situada em área de risco até a implementação das UPPs do complexo da Mineira, em fevereiro deste ano), a Escola Municipal Estados Unidos, vinculada à Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, com carga horária de 16 horas semanais, sendo 12 horas em sala de aula. Assumi este cargo no dia 25 de maio de 2010, após a entrada no Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, Área de Concentração: Literaturas Portuguesa e Africanas, em março de 2010, tendo sido aprovada em 3º lugar, com nota 9,0.
Quando recebi a bolsa do CNPq, era de conhecimento geral que eu possuía vínculo empregatício, mas este era claramente permitido, de acordo com a Portaria do dia 15 de julho de 2010. Além de ter tido a bolsa cortada, inapropriadamente, não houve consulta sobre minha possibilidade de querer ficar com a bolsa em detrimento do meu trabalho atual.
Comunico que sem bolsa deixarei o doutorado. E entrarei com todas as medidas legais individual ou coletivamente, para obter ressarcimento, indenização por danos morais e
ainda alguma forma de compensação para os alunos da escola em que eu
trabalho que, afinal, serão prejudicados, pois estão tendo nagado o direito de ter um professor qualificado.
Atenciosamente,
Rhea Sílvia Willmer
p.s.: Abaixo estão as cópias dos e-mails :1. que enviei ao CNPq; 2. que recebi da professora Aparecida Lino.
1
Rio de Janeiro,
11 de maio de 2011
Ao CNPq:
Venho, através desta, solicitar que sejam feitos maiores esclarecimentos
a respeito da “Nota sobre o acúmulo de bolsa e vínculo empregatício”, divulgada
recentemente, que à primeira vista me pareceu uma resolução para evitar o
acúmulo de bolsa de mestrado ou doutorado e salário por professores e
servidores das universidades públicas (federais e estaduais), de faculdades
privadas; e das escolas que formam a Rede Federal de Educação Profissional e
Tecnológica.
Parece que os documentos do Cnpq e da Capes são ambíguos quanto aos
critérios para acúmulo de bolsa e vínculo empregatício no caso do emprego de
professor (especialmente no caso do ensino básico), pois na Portaria de 15 julho de 2010, no artigo 1º
há clara alusão ao trabalho de professor: "$ 2º Os referidos bolsistas
poderão exercer atividade remunerada, especialmente quando se tratar de
docência como professores nos ensinos de qualquer grau".
Já na "Nota sobre o acúmulo de bolsa e vínculo empregatício",
há a explicitação de que o vínculo só poderá existir se for posterior à bolsa e
resultante da mesma. Embora a mesma nota cite a "educação
básica" como uma das "áreas estratégicas nas quais é academicamente
desejável a maior aproximação do pós-graduando com o
mercado". Certamente, na Faculdade de Letras, a maior parte dos
acúmulos se deve ao trabalho docente na educação básica. Portanto, é necessário
esclarecer este ponto junto à agência de fomento, pois os que se encontram
nesta situação deverão, se necessário, poder optar entre uma ou outra função,
evitando-se o corte sumário das bolsas.
Com base no Artigo 2º da Portaria: "Para receber complementação
financeira ou atuar como docente o bolsista deve obter
autorização, concedida por seu orientador, devidamente informada à coordenação
do curso ou programa de pós-graduação em que estiver matriculado e registrado
no Cadastro Discente da CAPES". De acordo com este artigo, a atividade
docente não está incluída na categoria "complementação financeira",
são duas coisas distintas, portanto. E, para que a atividade docente seja
exercida em concomitância com a bolsa, é necessário apenas que haja a devida
autorização (do orientador) e registro no cadastro discente da Capes. Não há
nenhuma referência à impossibilidade de que esta autorização seja feita no
momento em que o aluno é contemplado com a bolsa. O e-mail da diretora
substituta de programas de bolsas no país, Zena Martins, às coordenadorias de
pós-graduação não estabelece diferenciação entre as atividades, trata toda e
qualquer atividade exercida com vínculo como se fosse "complementação
financeira".
Ainda que seja cabível considerar que o salário de professor de
ensino público insere a atividade docente na categoria "complementação
financeira", uma vez que é muito menor que o valor das bolsas de mestrado
e doutorado. Ressalto ainda que normalmente a atividade docente possui carga
horária de até 16 horas semanais, o que está muito longe de uma jornada
integral que possa interferir no desempenho do aluno de pós-graduação.
É necessário esclarecer todas as dúvidas a respeito de uma suposta
"interpretação errônea" das instituições de ensino superior da
"Portaria conjunta nº 1 de 15 de julho de 2010". A meu ver, não há interpretação
errônea alguma na concessão de bolsas de pós-graduação para professores, pois
de acordo com a entrevista de esclarecimento do presidente da Capes, Jorge
Almeida Guimarães[1],
a respeito da Portaria nº1 de 2010, inserir profissionais da educação básica na
pós-graduação seria um dos objetivos desta Portaria (as citações foram tiradas
da referida entrevista): "Nós queremos induzir, por exemplo, a presença de
pessoas da educação básica na pós-graduação para melhorar sua qualificação, sua
titulação." Na entrevista, o presidente da Capes afirma que já
possuir vínculo empregatício não seria critério para a concessão ou não de
bolsas, observem a pergunta de número 10:
"O fato de a pessoa possuir
vínculo pode ser utilizado no critério de seleção para bolsas?"
Resposta: "Não. Não pode e nem deve. A seleção é por mérito. O que
vale na seleção é o mérito do candidato."
Ou seja, não houve uma interpretação errônea: os candidatos às bolsas de
pós-graduação poderiam ter vínculo antes da concessão das mesmas. Ou melhor, se
houve interpretação errônea foi a do presidente da Capes, que para esclarecer a
Portaria nº1 de 2010, afirmou que os futuros bolsistas poderiam ter vínculo anterior
à concessão das mesmas. O presidente da Capes afirma ainda que:
Todos os bolsistas poderão ter vínculos empregatícios desde que
atendidas as exigências que estão na portaria, ou seja, autorização do
orientador, além de atender ao item que trata de assinalar essa condição no
Cadastro de Discente e que, naturalmente, não afete o desempenho do aluno e
seja uma área compatível com a sua formação.
É preciso que a situação seja muito bem esclarecida, pois o corte de
bolsas poderá causar ainda mais transtornos se as bolsas concedidas desde 15 de
julho de 2010 forem consideradas irregulares, pois, de acordo com esta
"Portaria", o bolsista poderá ser obrigado a devolver os valores que
recebeu a título de bolsa (e se tornar um devedor da União): "Art. 3º No
caso de comprovado desrespeito às condições estabelecidas na presente portaria,
o bolsista será obrigado a devolver a CAPES ou CNPq os valores recebidos a
título de bolsa, corrigidos conforme a legislação vigente." E será
impossível para um professor da rede pública de ensino ter que trabalhar para
ressarcir uma bolsa recebida por mérito e direito, uma vez que os valores
referentes às bolsas são bem maiores que os valores referentes aos seus
salários. Ressalto ainda que manter a bolsa de quem passou a possuir o mesmo
tipo de vínculo empregatício após a vigência da bolsa é uma decisão arbitrária
e fere o princípio de isonomia e os direitos dos atuais bolsistas, que
receberam bolsas unicamente por mérito acadêmico.
Gostaria ainda que fosse esclarecido se o vínculo empregatício não
poderia ser antes da vigência da bolsa ou da solicitação da mesma, pois é
notório o fato de que, na maior parte das vezes (ao menos na área de Letras
Vernáculas da UFRJ), os bolsistas esperam a bolsa por períodos que variam de 6
a 18 meses. Pois se o aluno começou a trabalhar em área relacionada após o
início do curso de pós-graduação e está mantendo o desempenho acadêmico, a
única diferença para com os critérios (duvidosos) presentes na “nota de
esclarecimento” é a demora da concessão das bolsas, o que, muitas vezes, obriga
o pós-graduando a buscar uma fonte de renda com o principal objetivo de se
manter no curso de Mestrado ou Doutorado. Observe-se ainda que o texto da “nota
sobre o acúmulo de bolsa e vínculo empregatício” faz referência à relevância do
vínculo empregatício quando consequência da sua pesquisa, no entanto há de ser
observado que o início da pesquisa, na maior parte das vezes, é anterior à
concessão das bolsas, portanto o dado cronológico não deve ser o único a ser
levado em consideração neste caso. Afinal, se o candidato à bolsa precisar
exercer atividade remunerada correlacionada com o tema da sua pesquisa e inicia
esta atividade após o início do curso de pós-graduação, mas antes da concessão
da bolsa, não faz sentido que seja punido com base no critério referente ao
vínculo empregatício anterior à concessão da mesma.
A Portaria tem o propósito claro de permitir aos bolsistas da CAPES ou
do CNPq a opção de acumular a bolsa de pós-graduação, níveis mestrado e
doutorado, com um vínculo empregatício remunerado, desde que venha a atuar
profissionalmente na sua área de formação e cujo trabalho seja correlacionado
com o tema da sua dissertação/tese e, portanto, quando tal vínculo empregatício
seja resultante de sua condição de bolsista e como consequência do tipo de
projeto que esteja desenvolvendo.
Por exemplo: se minha pesquisa exige, de alguma forma, minha atuação em
sala de aula e em consequência disso eu comecei a trabalhar numa instituição
básica de ensino – que é, friso, “uma das áreas estratégicas nas quais é
academicamente desejável a maior aproximação do pós-graduando com o mercado” –
após a solicitação da bolsa, mas antes da vigência da mesma, devo perder,
automaticamente, o direito de obter essa bolsa? Gostaria de obter uma resposta
específica a esta indagação.
Observe-se que de acordo com notícia publicada no Diário de Pernambuco[2],
a resolução que contradiz a entrevista do presidente da Capes, Jorge Almeida
Guimarães, foi emitida pela diretora substituta de programas e bolsas no país,
Zena Martins, no dia 02 de maio do corrente ano, ou seja, aparentemente a
interpretação dada por ela a respeito da nota de esclarecimento à referida
Portaria é a única que dá ênfase total ao fato do bolsista possuir vínculo
anterior à concessão da bolsa. Note-se que segundo esta notícia, trabalhadores
da rede púbica de ensino básico podem acumular a bolsa:
Quem pode acumular a bolsa: Aqueles que estão afastados integralmente
do trabalho, sem receber vencimento por isso, os bolsistas que começaram a
trabalhar em área relacionada ao tema de seu estudo e os trabalhadores da rede pública de ensino básico ou da área de saúde coletiva
(estes, desde que liberados integralmente da atividade profissional).
Quem não pode acumular a bolsa: Funcionários da instituição de ensino
onde cursa a pós-graduação, professores de nível superior, tanto de
instituições públicas, quanto privadas (estes têm programas de bolsas
específicos) e quem já se encontra trabalhando, formal ou informalmente, antes
de se candidatar à bolsa.
Faz-se necessário buscar esclarecimento a respeito deste ponto específico
junto às agências de fomento: É possível que o bolsista tenha vínculo com
instituições de educação básica de ensino público?
Peço ainda que, tão logo sejam feitos os devidos esclarecimentos, caso a necessidade de não ter nenhum vínculo empregatício
antes da vigência da bolsa seja realmente o único critério válido para a
concessão da mesma, que os bolsistas possam ser comunicados a respeito e que
possam decidir entre a manutenção da bolsa (com eventuais pedidos de licenças
sem vencimentos ou rompimento de vínculos e contratos empregatícios) ou do
vínculo.
Atenciosamente,
Rhea
Sílvia Willmer
Doutoranda em Literatura
Portuguesa (desde março de 2010), aprovada em 3º lugar com média 9;
professora da RedePública Municipal de Ensino do Rio de
Janeiro (desde maio de 2010), aprovada em concurso público na 36ª
colocação, trabalhando em área recentemente contemplada com UPPs
(Unidades de Polícia Pacificadora), com carga horária de 16 horas
semanais; e bolsista do CNPq (desde março de 2011), unicamente por
mérito acadêmico, tendo obtido nota máxima em todas as disciplinas do
curso de Doutorado, tendo participado de três Congressos e Seminários
desde o início do doutoramento e com artigos publicados e em vias de
publicação em revistas acadêmicas das áreas de Literaturas Portuguesa,
Brasileira e Africanas.
contato: rheawillmer@gmail.com
Endereço: Rua Monte Alegre, 312, Santa Teresa, Rio de Janeiro/RJ, CEP: 20240-193
Telefones: (21) 2210-0857, (21) 7219-4800
[2]
http://www.diariodepernambuco.com.br/nota.asp?materia=20110509112148
2Em 13 de maio de 2011 15:37, Maria Aparecida Lino Pauliukonis
<aparecidalino@gmail.com> escreveu:
Prezados alunos:
Enviei a PR-2 o e mail elaborado juntamente com Juliana, representante dos alunos,expondo a situação de cada bolsista. O assunto do corte das bolsas foi levado ao Reitor pela Pró-Reitora Profa. Angela Uller e discutido até no CONSUNI, quando então foi feito um pedido ao Reitor que se posicionasse junto a CAPES, em nome da UFRJ, sobre todos os casos de bolsistas com vínculo. Recebemos o e mail abaixo, vindo da PR-2, assinado pela Sr. Julio Gravina e tivemos que prestar as informações pedidas. Assim sendo, foi enviada uma lista com o nome de todos (CAPES e CNPq) com as especificações pedidas. Os alunos terão suas bolsas canceladas no momento. Vamos aguardar os desdobramentos.
Profa. Aparecida Lino
E-mail recebido em 12/5/2011, às 16 horas
"De ordem da Pró-reitora de
Pós-graduação e Pesquisa, Professora Angela Uller solicito sua gentileza
de nos esclarecer, dentre os alunos que terão suas bolsas canceladas
por motivo de vínculo empregatício, as informações abaixo:
NOME DO ALUNO; NOME DA INSTITUIÇÃO NA QUAL MANTÉM VÍNCULO -
CARÁTER (PÚBLICA OU PARTICULAR); NÍVEL DE MINISTRAÇÃO DE AULAS (BÁSICO,
MÉDIO OU SUPERIOR).
Tendo em vista a análise dessas informações, peço que nos sejam encaminhadas, por e-mail, até o dia 13/05/2011.
Atenciosamente,
Julio Gravina Marques
Diretor de Programas e Bolsas/PR2